Cinco Horas
Minha mesa no Café
Quero-lhe tanto ... A garrida
Toda de pedra brunida
Que linda e fresca é
Um sifão verde no meio
E, ao seu lado, a fosforeira
Diante ao meu copo cheio
Duma bebida ligeira.
(Eu bani sempre os licores
Que acho pouco ornamentais:
Os xaropes têm cores
Mais vivas e mais brutais).
Sobre ela posso escrever
Os meus versos prateados,
Com estranheza dos criados
Que me olham sem perceber ...
Sobre ela descanso os braços
Numa atitude alheada
Buscando pela ar os traços
Da minha vida passada.
Ou acendendo cigarros,
- Pois há um ano que fumo –
Imaginário presumo
Os meus enredos bizarros.
(E se acaso em minha frente
Uma linda mulher brilha,
O fumo da cigarrilha
Vai beija-la, claramente).
Um novo freguês que entra
É novo actor no tablado,
Que o meu olhar fatigado
Nele outro enredo concentra.
É o carmim daquela boca
Que ao fundo descubro, triste,
Na minha ideia persiste
E nunca se desloca
Cinge tais futilidades
A minha recordação,
A destes vislumbres são
As minhas maiores saudades ...
(Que história de oiro tão bela
Na minha vida abortou:
Eu fui herói de novela
Que autor nenhum empregou ...)
Nos cafés espero a vida
Que nunca vem ter comigo
- Não me faz nenhum castigo
Que o tempo passa em corrida.
Passar tempo é o meu fito,
Ideal que só me resta:
P’ra mim não há melhor festa,
Nem mais nada cho bonito.
- Cafés da minha preguiça,
Sois hoje – que galardão! –
Todo o meu campo de acção
E toda minha cobiça.
(Mário Sá Carneiro)
Ideal que só me resta:
P’ra mim não há melhor festa,
Nem mais nada cho bonito.
- Cafés da minha preguiça,
Sois hoje – que galardão! –
Todo o meu campo de acção
E toda minha cobiça.
(Mário Sá Carneiro)
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