22 setembro, 2009

320 - Minha Terra tem Palmeiras














































Foto: Shark
Canção do exilio

Minha terra tem palmeiras
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar — sozinho, à noite —
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Gonçalves Dias
Coimbra, Julho 1843

319 - Reciclar é preciso

Foto: Shark
Rap Ecológico

Devemos cuidar
Do meio ambiente
Afinal de contas
É a casa da gente.
O nosso projeto
É uma beleza
Ensina a gente
A cuidar da natureza
Como é que vamos
Cuidar do meio ambiente?
Do jeito que está
Vai ficar permanente
Olha só meu amigo
Quanta poluição
Vamos já procurar
Uma boa solução
Já conheço uma
Que é bem legal
Reciclar papel
É fundamental
Separar o lixo
Não é nada difícil
Se você pensar
Logo vai notar
Esse é o rap
Do projeto ecologia
Venha conosco
Mergulhar nessa magia
Colaboração de Artur Gehlen Adams quando tinha 9 anos. NH

318 - A minha cidade













































Foto: Shark

A minha cidade

A minha cidade não se chama Lisboa,
não tem cheiro a sul
e nem por ela passa o Tejo,
mas como ela, tem Nascentes
leitosos e marmóreos...
Na minha cidade os Poentes são de ouro
sobre o Douro e o mar
e só ela tem a luz do entardecer
a enfeitar o granito...
Na minha cidade, tal como em Lisboa
há gaivotas e maresia
mas não há cacilheiros no rio
há rabelos
transportando nectar e almas...
Da minha cidade nasce o Norte
alcantilado, insubmisso
e o sol, quando chega, penetra-a
delicadamente, carinhosamente,
depois de vencido o nevoeiro...
Na minha cidade também há pregões,
gatos, pombas, castanhas assadas e iscas
e fado pelas vielas, pendurado com molas,
como roupa a secar nos arames...
A minha cidade tem também tardes languescentes,
coretos nas praças
velhos jogando cartas em mesas de jardim
e o revivalismo de viuvas e solteironas
passeando de eléctrico...
É bem verdade que na minha cidade
a luz, não é como a de Lisboa
mas a luz da minha cidade
é um frémito de amor do astro-rei
a beijá-la na fronte, cada manhã!...

Maria Mamede

15 setembro, 2009

317 - Nuclear

Foto: Shark
Psicologia de Um Vencido

Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênesis da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundíssimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme — este operário das ruínas —
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há-de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!
(Augusto dos Santos)

316 - Rubra, incandescente

Foto: Shark

Vaso Chinês

Estranho mimo, aquele vaso! Vi-o
Casualmente, uma vez, de um perfumado
Contador sobre o mármor luzidio
Entre um leque e o começo de um bordado.

Fino artista chinês, enamorado,
Nele pusera o coração doentio
Em rubras flores de um sutil lavrado
Na tinta ardente, de um calor sombrio.

Mas, talvez por contraste à desventura —
Quem o sabe? — de um velho mandarim
Também lá estava a singular figura.

Que arte em pintá-la! A genta acaso vendo-a
Sentia um não sei quê com aquele chim
De olhos cortados à feição de amêndoa.
(Alberto Oliveira)

315 - POEMA DA BICICLETA

Foto: Shark

POEMA DA BICICLETA

Era uma vez
Uma bicicleta
Que eu tinha
Que era minha...
Que não tinha rodas
Mas que rodava comigo
Mundo a fora
Afora o horário

E eu nem amava o sonho
Pois não sabia
Aquilo o que era
Só sei que viajava
E achava bonito
Pedalar, sem cessar
Sem cansar

Sem sair do lugar
Ir a todo lugar
Até chegar no fim
(do sonho);
Uma bicicleta nova
Que nunca me levou...
A lugar nenhum
S. Paulo, 24/02/2003
CORDEIRO

314 - Apontamentos

Foto: Shark

Ao correr da pena

Uma prateleira branca
Com palavras cujas lombadas,
ficam tão bem arrumadas…

cada palavra tem uma história
por detrás,
ou mais do que uma,
tanto faz…

Num acto solitário,
que a solidão é um receio primário,
instintivo, na arrumação
temo a cada passo a constatação
de mais um fracasso …

Logo abaixo da primeira
preenchi outra com palavras destinadas
a serem devoradas…

Olhares famintos de coisas interessantes
que me inibo de acreditar ser capaz de arrumar
com os meus dedos hesitantes.
Letras estampadas que me compete juntar
em palavras arrumadas

A estante quase a abarrotar
com o que consigo dar
a viajantes virtuais que procuram os sinais
que vou deixando aqui e além,
pequenos marcadores
com relatos dos meus amores
ou de outra coisa qualquer,
tudo aquilo que puder encaixar
nos espaços vazios
que tento forrar de ideias e emoções,
de pensamentos e sensações
que me definem
aos olhos de quem se serve agora
desta obra sempre inacabada
que anseio ter forças para prolongar.

Esta tentativa vã,
frustrada,
de me conseguir comunicar.
(Shark)