Foto: Charquinho
Poema para uma mosca morta
Vendo a mosca morta assim
Estatelada
Morta mesmo
Sobre a fórmica branca
Limpinha
Patas pra cima
Olhos estáticos
Asinhas coladas ao chão
Pobrezinha
Me vem até certa comoção
Mas isso vendo-lhe assim,
Tão pequenina
Mas imaculada
Sem destroço
Nem nada
As duas asinhas meio tortas
Mas ainda coladas ao corpo
Caso contrário,
Sentiria só nojo
Percebo, assim
Que a cota
Do que me toca
É como você,
Pequenina
Morta assim
Inteirinha
Sem asa pra um lado
Nem sangue espalhado
Consegues pousar leve
Sobre a minha consciência
E se instalar
Nessa superfície branca
E insípida
Constato
Não sem horror,
Mas com certa alegria,
Que o meu estômago
E simpatia
Só respondem a uma certa quantia
De carne e de
Ou parentesco
Na escala evolutiva
Um bom exemplo,
A foto do elefante morto
Congelado, nas geleiras do Himalaia
Mesmo encontrado inteiro
Imaculado
Faltando na verdade somente a ponta do rabo
Isso sim
Me ojeriza
E tomba
Sobre a minha espinha
22 setembro, 2008
19 setembro, 2008
233 - Aos Bombeiros
Foto: Charquinho
BOMBEIROS
Altas horas da madrugada
A sirene faz-se ouvir
Ela grita alarmada
Para o bombeiro acudir
Para o quartel se apressa
Sem saber o seu destino
De momento, nada lhe interessa
O fogo é o seu caminho
Chegado ao incêndio
O reconhecimento ele faz
Mandando avançar
Os meios que acha eficaz
Sozinho no denso arvoredo
Por entre o fumo e as chamas
Ele sente medo de não voltar
Para junto daqueles que ama
O fogo com a sua astúcia
Vai cercando o bombeiro
Que dentro de uma angústia
Quer fugir daquele braseiro
Sentindo a morte a aproximar
Ele pensa na sua família
Que jamais poderá amar
A partir daquele dia
Assim morreu o bombeiro
Na sua abnegação
Valente e altaneiro
Soube cumprir a sua missão
Desse homem valente
Apenas ficou a recordação
Mas só sua família sente
Grande mágoa no coração
Tu és bombeiro altaneiro
Homem de fé e valor
Não o és por dinheiro
Mas apenas por amor
BOMBEIROS
Altas horas da madrugada
A sirene faz-se ouvir
Ela grita alarmada
Para o bombeiro acudir
Para o quartel se apressa
Sem saber o seu destino
De momento, nada lhe interessa
O fogo é o seu caminho
Chegado ao incêndio
O reconhecimento ele faz
Mandando avançar
Os meios que acha eficaz
Sozinho no denso arvoredo
Por entre o fumo e as chamas
Ele sente medo de não voltar
Para junto daqueles que ama
O fogo com a sua astúcia
Vai cercando o bombeiro
Que dentro de uma angústia
Quer fugir daquele braseiro
Sentindo a morte a aproximar
Ele pensa na sua família
Que jamais poderá amar
A partir daquele dia
Assim morreu o bombeiro
Na sua abnegação
Valente e altaneiro
Soube cumprir a sua missão
Desse homem valente
Apenas ficou a recordação
Mas só sua família sente
Grande mágoa no coração
Tu és bombeiro altaneiro
Homem de fé e valor
Não o és por dinheiro
Mas apenas por amor
232 - Quase com vida
Foto: Charquinho
Pedra Lioz
Álvaro Gois,
Rui Mamede,
filhos de António Brandão,
naturais de Catanhede,
pedreiros de profissão,
de sombrias cataduras
como bisontes lendários,
modelam ternas figuras
na lentidão dos calcários.
Ali, no esconso recanto,
só o túmulo, e mais nada,
suspenso no roxo pranto
de uma fresta geminada.
Mas no silêncio da nave,
como um cinzel que batuca,
soa sempre um truca…truca…
lento, pausado, suave,
truca, truca, truca, truca,
sob a abóbada romântica,
como um cinzel que batuca
numa insistência satânica:
truca, truca, truca, truca,
truca, truca, truca, truca.
Álvaro Gois,
Rui Mamede,
filhos de António Brandão,
naturais de Cantanhede,
ambos vivos ali estão,
truca, truca, truca, truca,
vestidos de sunobeco
e acocorados no chão,
truca, truca, truca, truca.
No friso, largo de um palmo,
que dá volta a toda a arca,
um cristo, de gesto calmo,
assiste ao chegar da barca.
Homens de vária feição,
barrigudos e contentes,
mostram, no riso dos dentes
o gozo da salvação.
Anjinhos de longas vestes,
e cabelo aos caracóis,
tocam pífaro celestes,
entre cometas e sóis.
Mulheres e homens, sem paz,
esgaseados de remorsos,
desistem de fazer esforços,
entregam-se a Satanás.
Fixando a pedra, mirando-a,
quanto mais o olhar se educa,
mais se estende o truca…truca…
que enche a nave, transbordando-a,
truca, truca, truca, truca
truca, truca, truca, truca.
No desmedido caixão,
grande sonhor ali jaz.
Pupilo de Satanás?
Alma pura, de eleição?
Dom Afonso ou Dom João?
Para o caso tanto faz.
Pedra Lioz
Álvaro Gois,
Rui Mamede,
filhos de António Brandão,
naturais de Catanhede,
pedreiros de profissão,
de sombrias cataduras
como bisontes lendários,
modelam ternas figuras
na lentidão dos calcários.
Ali, no esconso recanto,
só o túmulo, e mais nada,
suspenso no roxo pranto
de uma fresta geminada.
Mas no silêncio da nave,
como um cinzel que batuca,
soa sempre um truca…truca…
lento, pausado, suave,
truca, truca, truca, truca,
sob a abóbada romântica,
como um cinzel que batuca
numa insistência satânica:
truca, truca, truca, truca,
truca, truca, truca, truca.
Álvaro Gois,
Rui Mamede,
filhos de António Brandão,
naturais de Cantanhede,
ambos vivos ali estão,
truca, truca, truca, truca,
vestidos de sunobeco
e acocorados no chão,
truca, truca, truca, truca.
No friso, largo de um palmo,
que dá volta a toda a arca,
um cristo, de gesto calmo,
assiste ao chegar da barca.
Homens de vária feição,
barrigudos e contentes,
mostram, no riso dos dentes
o gozo da salvação.
Anjinhos de longas vestes,
e cabelo aos caracóis,
tocam pífaro celestes,
entre cometas e sóis.
Mulheres e homens, sem paz,
esgaseados de remorsos,
desistem de fazer esforços,
entregam-se a Satanás.
Fixando a pedra, mirando-a,
quanto mais o olhar se educa,
mais se estende o truca…truca…
que enche a nave, transbordando-a,
truca, truca, truca, truca
truca, truca, truca, truca.
No desmedido caixão,
grande sonhor ali jaz.
Pupilo de Satanás?
Alma pura, de eleição?
Dom Afonso ou Dom João?
Para o caso tanto faz.
(António Gedeão)
231 - Arco-da-Velha
Foto: Charquinho
Arco-Iris
Choveu tanto esta tarde
Que as árvores estão pingando de contentes.
As crianças pobres, em grande alarde,
Molham os pés nas poças reluzentes.
A alegria da luz ainda não veio toda.
Mas há raios de sol brincando nos rosais.
As crianças cantam fazendo roda,
Fazendo roda como os tangarás:
"Chuva com sol!
Casa a raposa com o rouxinol."
De repente, no céu desfraldado em bandeira,
Quase ao alcance da nossa mão,
O Arco-da-Velha abre na tarde brasileira
A cauda em sete cores, de pavão.
Arco-Iris
Choveu tanto esta tarde
Que as árvores estão pingando de contentes.
As crianças pobres, em grande alarde,
Molham os pés nas poças reluzentes.
A alegria da luz ainda não veio toda.
Mas há raios de sol brincando nos rosais.
As crianças cantam fazendo roda,
Fazendo roda como os tangarás:
"Chuva com sol!
Casa a raposa com o rouxinol."
De repente, no céu desfraldado em bandeira,
Quase ao alcance da nossa mão,
O Arco-da-Velha abre na tarde brasileira
A cauda em sete cores, de pavão.
Olegário Maria
(Poeta Brazileiro)
03 setembro, 2008
230 - Poemas à Lua
Fotos: Charquinho
Ó Lua que vas tã alta,
redonda como o...
esses tés olhos menina
parecem rodas de um carro
Ó lua que vas tã alta
Redonda como um tamanco
Ó Maria traz cá as escadas
Q’eu nã lhe chego cum banco
Além naquele monti
Mandê fazer um castelo
P´ra depois dezer à Lua
Eu daqui te comtempélo
Ó Lua que vas tã alta,
redonda como o...
esses tés olhos menina
parecem rodas de um carro
Ó lua que vas tã alta
Redonda como um tamanco
Ó Maria traz cá as escadas
Q’eu nã lhe chego cum banco
Além naquele monti
Mandê fazer um castelo
P´ra depois dezer à Lua
Eu daqui te comtempélo
Do floclore português
01 setembro, 2008
229 - O Tejo, sempre
Foto: Charquinho
"Ode ao Tejo e à Memória de Álvaro de Campos"
E aqui estou eu,
ausente diante desta mesa -
e ali fora o Tejo.
Entrei sem lhe dar um só olhar.
Passei, e não me lembrei de voltar a cabeça,
e saudá-lo deste canto da praça:
"Olá, Tejo! Aqui estou eu outra vez!"
Não, não olhei.
Só depois que a sombra de Álvaro de Campos se sentou a meu lado
me lembrei que estavas aí, Tejo.
Passei e não te vi.
Passei e vim fechar-me dentro das quatro paredes, Tejo!
Não veio nenhum criado dizer-me se era esta a mesa em que
Fernando Pessoa se sentava,
contigo e os outros invisíveis à sua volta,
inventando vidas que não queria ter.
Eles ignoram-no como eu te ignorei agora, Tejo.
Tudo são desconhecidos, tudo é ausência no mundo,
tudo indiferença e falta de resposta.
Arrastas a tua massa enorme como um cortejo de glória,
e mesmo eu que sou poeta passo a teu lado de olhos fechados,
Tejo que não és da minha infância,
mas que estás dentro de mim como uma presença indispensável,
majestade sem par nos monumentos dos homens,
imagem muito minha do eterno,
porque és real e tens forma, vida, ímpeto,
porque tens vida, sobretudo,
meu Tejo sem corvetas nem memórias do passado...
Eu que me esqueci de te olhar!
Adolfo Casais Monteiro
"Ode ao Tejo e à Memória de Álvaro de Campos"
E aqui estou eu,
ausente diante desta mesa -
e ali fora o Tejo.
Entrei sem lhe dar um só olhar.
Passei, e não me lembrei de voltar a cabeça,
e saudá-lo deste canto da praça:
"Olá, Tejo! Aqui estou eu outra vez!"
Não, não olhei.
Só depois que a sombra de Álvaro de Campos se sentou a meu lado
me lembrei que estavas aí, Tejo.
Passei e não te vi.
Passei e vim fechar-me dentro das quatro paredes, Tejo!
Não veio nenhum criado dizer-me se era esta a mesa em que
Fernando Pessoa se sentava,
contigo e os outros invisíveis à sua volta,
inventando vidas que não queria ter.
Eles ignoram-no como eu te ignorei agora, Tejo.
Tudo são desconhecidos, tudo é ausência no mundo,
tudo indiferença e falta de resposta.
Arrastas a tua massa enorme como um cortejo de glória,
e mesmo eu que sou poeta passo a teu lado de olhos fechados,
Tejo que não és da minha infância,
mas que estás dentro de mim como uma presença indispensável,
majestade sem par nos monumentos dos homens,
imagem muito minha do eterno,
porque és real e tens forma, vida, ímpeto,
porque tens vida, sobretudo,
meu Tejo sem corvetas nem memórias do passado...
Eu que me esqueci de te olhar!
Adolfo Casais Monteiro
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